"Aquele que ressuscitou Cristo dos mortos vivificará também os vossos corpos mortais, por meio do Seu Espírito, que habita em vós" (Rm.8,11).
A vida segundo o Espírito é a vida que arranca da novidade da Ressurreição de Jesus e se projecta na ressurreição final.
"Em nome da Ressurreição de Cristo, a Igreja anuncia a vida, que se manifestou para além das fronteiras da morte, a vida que é mais forte que a morte" (DV 58).
Tal vida, porém, é a vida segundo o Espírito. "Unida ao Espírito Santo, a Igreja é consciente, mais do que ninguém, do homem interior, dos traços que no homem são mais profundos e essenciais, porque incorruptíveis. É neste nível que o Espírito enxerta a "raíz da imortalidade", da qual desponta a vida nova, ou seja, a vida do homem em Deus, que, como fruto da divina auto-comunicação salvífica no Espírito Santo, só pode desenvolver-se e consolidar-se sob a acção do mesmo Espírito" (DV 58).
"Deus, uno e trino ... ao comunicar-Se no Espírito Santo como dom ao homem, transforma o mundo humano a partir de dentro, a partir do interior dos corações e das consciências" (DV 58).
Quando o homem se deixa transformar, por docilidade ao Espírito, a partir do seu interior, faz a descoberta do que é e do que vale e, apartir daí, só entende a sua vida como abertura e doação a Deus e ao próximo. "Neste caminho, o Espírito Santo, consolidando em cada um de nós o "homem interior", faz com que o homem cada vez mais se encontre plenamente através do dom sincero de si" (DV 59).
A VIDA SEGUNDO O ESPÍRITO É VIDA EM GRAÇA, MAS COMPROMETIDA COM OS HOMENS
O que vive segundo o Espírito não está livre do peso da vida, da opacidade da exixtência terrena, das tribulações da dor e das angústias e da sujeição ao império da morte. O que vive segundo o Espírito assume sem lamúrias esta condição humana; compreende-a como pertencendo à sua estrutura criacional; acolhe a mortalidade e pequenez como vindas de Deus ("acolhei tudo como vindo das mãos de Deus" - dizia a Mãe Clara).Mas não organiza a sua vida em função da carne. Dá-se conta de um apelo maior: o mundo não pode definir o quadro final da sua vida nem fornece o sentido derradeiro do pulsar do coração. Somente Deus, a Quem chegamos atravessando a morte ("é morrendo que se vive") pode ser o descanso do coração inquieto. Por isso, o homem espiritual vê este mundo com os olhos da eternidade, a vida ultrapassando para além da morte, e a condição presente como ordenada à condição celeste ainda por vir ("no desânimo, lembremo-nos do céu e essa esperança nos alentará").
VIVER SEGUNDO O ESPÍRITO é viver filialmente face a Deus, na devota obediência à Sua vontade ("amemos a Deus e só a Deus"); fraternalmente com os irmãos ( "praticai a caridade com a maior perfeição") e senhorilmente frente ao mundo como um livre senhor e responsável pela recta ordem das realidades mundanas. Quem vive SEGUNDO O ESPÍRITO viverá sempre mesmo que passe pela morte, porque participa da FONTE DA VIDA que é Deus. À luz desta compreensão, Jesus podia dizer: "o Espírito é Quem dá a Vida; a carne para nada serve" (Jo.6,33). E Paulo redizia: "as tendências da carne são a morte, mas as do Espírito são a vida e a paz" (Rm.8,6).
A vida humana destina-se a ser O TEMPLO DE DEUS. O homem existe por causa de Deus e para Deus. Deus quer comunicar de tal forma a própria VIDA, que criou a vida humana para poder divinizá-la, o que equivale dizer, para fazê-la Sua. É então que Deus SE faz homem. E ao fazer-SE homem, Ele diviniza o homem.
A VIDA EM GRAÇA é vida segundo o Espírito. No homem trava-se uma luta e existe uma permanente tensão entre "a abertura à acção do Espírito Santo e a resistência e oposição a Ele, dom salvífico". "Os termos ou pólos contrapostos são aqui: da parte do homem, as suas limitações e pecaminosidade e da parte de Deus o Mistério do Dom, o incessante doar-se da vida no Espírito Santo" (DV 55).
O que será viver em graça?
É essencialmente isto: saber acolher o DOM. Da parte do Espírito, podemos ter a certeza que Ele "vem em auxílio da nossa fraqueza" (Rm.8,26).
A GRAÇA DE DEUS não é uma "coisa" colocada em nós. A GRAÇA é a própria Vida de Deus a circular na nossa vida, é Deus em nós. Abrir-nos a esta vida, fazê-la circular em nós, alimentá-la, orientar por Ela tudo o que somos e fazemos é a parte que nos é pedida como acolhimento de correspondência ao DOM. VIVER EM GRAÇA não é ter em si alguma coisa. É SER EM DEUS, é uma respiração divina.
de D. Manuel Madureira - in 15 Catequeses sobre o Espírito Santo
Notas a cor - Madre Maria Clara do Menino Jesus - in "Escuta"